Em uma decisão que reacende o debate sobre os limites da liberdade de imprensa e os direitos de figuras públicas condenadas por crimes de grande repercussão, o Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) deu ganho de causa ao jornalista e escritor Ullisses Campbell em uma ação movida por Suzane Louise Magnani Muniz — anteriormente conhecida como Suzane von Richthofen.
Suzane alegava que havia sido ofendida por Campbell ao ser chamada de “ilustre psicopata” e ao ter sua residência mencionada como sendo em Águas de Lindóia (SP). O conteúdo, segundo ela, teria lhe causado constrangimento, humilhação e prejuízo à sua honra. No entanto, a juíza responsável pelo caso, Ana Paula Schleiffer Livreri, entendeu que as postagens tinham caráter essencialmente informativo e estavam dentro do contexto de interesse público, considerando que Suzane foi condenada por um crime que marcou profundamente a história criminal brasileira.
A defesa do jornalista, feita pelo advogado Alexandre Fidalgo, argumentou que não houve nenhum ataque pessoal ou calúnia, mas sim uma exposição jornalística com base em fatos já amplamente conhecidos. “Essa é a terceira ação que a Suzane move contra o meu cliente. Uma delas tentou proibir a publicação de um livro.
A magistrada rejeitou a tese de que a expressão pudesse ser considerada ofensiva em si, especialmente diante do histórico da autora da ação.
Em sua decisão, ela apontou que o termo “psicopata” descreve uma perturbação de personalidade caracterizada por comportamentos antissociais — elementos comprovadamente associados à conduta de Suzane no caso em que foi condenada. Além disso, a juíza destacou que uma eventual retratação apenas ampliaria a visibilidade dos fatos, o que contradiz o suposto objetivo da autora de preservar sua imagem.
Sobre a menção à residência de Suzane, a juíza também não viu ilegalidade. “A situação específica dos comentários lançados pelo réu, a respeito da moradia da autora junto à Cidade de Águas de Lindóia, não configura por si só ato ofensivo”, afirmou. Ela avaliou que tal informação não traz nenhum prejuízo direto à integridade moral da autora e tampouco foi apresentada de forma invasiva ou sensacionalista.
Essa não é a primeira vez que Ullisses Campbell enfrenta ações judiciais relacionadas ao seu trabalho de investigação sobre o caso Richthofen. Em 2019, o Supremo Tribunal Federal derrubou uma decisão de censura prévia que impedia a publicação do livro, de sua autoria. O livro acabou sendo lançado no ano seguinte, gerando debates em todo o país sobre a trajetória de Suzane após sua condenação e a tentativa de reconstruir sua vida longe dos holofotes — o que contrasta com sua constante presença em entrevistas e outros conteúdos públicos.
O caso Richthofen permanece, mais de duas décadas depois, como um dos crimes mais marcantes e controversos da história recente do Brasil. Em 2002, Suzane, então com 18 anos, ajudou a planejar e executar o assassinato dos próprios pais, Manfred e Marísia, com a ajuda do namorado Daniel Cravinhos e do cunhado Cristian Cravinhos.
A decisão do TJSP é, acima de tudo, simbólica: reafirma o direito da imprensa de noticiar fatos de interesse público, mesmo quando envolvem figuras que desejam apagar seus passados.